Enviada em: 23/08/2018

Diante do contexto absolutista da Inglaterra, por volta do século XIII, nasceu a Carta Magna, mãe dos Direitos Humanos. Apesar de tardiamente, em 1988, cria-se uma nova constituição brasileira, que reconhece princípios básicos, tais quais a equidade, dignidade e liberdade, como direitos civis. Entretanto, o país ainda revela-se berço de um retardo estrutural grave ao ter a violência obstétrica como um dos maiores vetores do panorama do desrespeito à integridade humana. Cabe, desse modo, uma reanálise conjuntural acerca dos desafios para o alcance de uma sociedade mais humanizada.    Em princípio, é válido ressaltar que o direito sobre o próprio corpo é um patrimônio essencial, individual e irrevogável. Ainda que o Brasil registre, segundo pesquisa da Fundação Perseu Abramo, que uma a cada quatro mulheres já foram vítimas da hostilidade médica no pré, durante e pós-natal, o Estado ainda demonstra grande negligência ao não prever punição a essas práticas. A violação, que pode configurar-se de forma física, verbal ou psicológica, é um dos principais motivos que devem ser associados aos casos de depressão pós-parto, haja visto que o uso de brutalidade e o desrespeito com o corpo feminino ferem não somente a honra, como também geram dores irreparáveis às mães em estado de vulnerabilidade.   Nesse sentido, técnicas que contrariem a vontade da mãe e a submetam desnecessariamente a situações de perigo estão intrinsecamente associados a um machismo estrutural enraizado no âmago da sociedade e à falta de preparo profissional. Uma vez que o bebê e a mãe são expostos aos riscos de um parto desumanizado, põe-se em cheque a ética médica, comprometendo a credibilidade de um sistema de saúde inteiro. Os procedimentos mais comuns, como a episiotomia, um corte feito apenas em casos de extrema necessidade, e a manobra de Kristeller, que consiste no uso de pressão contra a barriga para forçar o nascimento, podem ocasionar problemas tanto à mulher quanto ao filho, que está suscetível a choques mecânicos, lesões irreversíveis e outros traumas graves.    Fica nítida, portanto, a necessidade de intervenção e revisão, pelo Conselho Federal de Medicina, em consonância com o Ministério da Saúde, no Código de Ética Médica, a fim de atingir um alinhamento com as recomendações feitas pela OMS (Organização Mundial de Saúde), extinguindo práticas arcaicas e desnecessárias de um procedimento comum de parto, e punir os transgressores. Além disso, é fundamental que o Ministério da Saúde atue na criação de um portal para a realização de denúncias de hospitais e profissionais e também na prestação de acompanhamento médico e psicológico às vítimas, para que não se sintam desamparadas e negligenciadas. Dessa forma, o princípio da liberdade, sobretudo de escolha, já preconizado pelo documento inglês de oito séculos atrás, será respeitado. como realmente deve ser.