Enviada em: 09/05/2018

Exatos quarenta anos após a pintura de "Os retirantes", em que Candido Portinari denunciou a realidade subumana da seca e da miséria, o Brasil deixou o Mapa da Fome. Signatário dos objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU, o país propõe-se a erradicar o flagelo até 2030. No entanto, o desmonte das políticas públicas direcionadas à promoção da dignidade humana traz à tona a volta da brutal espoliação do direito à alimentação previsto no art. 6º da Magna Carta.             No âmbito histórico, é relevante apontar a gênese do flagelo. Em conformidade com o sociólogo Betinho, o "crime ético" da inanição decorre da perversa exclusão social pela qual foram acometidos enormes contingentes populacionais no país. Nessa perspectiva, a insegurança alimentar associa-se estreitamente à pobreza, sendo os programas de transferência de renda fundamentais em sua erradicação. Decerto, medidas como o corte de beneficiários do Bolsa Família e o teto de gastos públicos por vinte anos reintroduzem, de maneira inaceitável, o fantasma da fome endêmica no Brasil.       Paralelamente à diminuição da desigualdade socioeconômica, insere-se a importância da agricultura familiar, evidenciada pelo relatório da FAO sobre o Estado da Alimentação e da Agricultura. Consoante o SOFA 2014, a fome recrudesceu no Brasil por intermédio do fomento à produção agrícola local, seja pela assessoria técnica, seja pela canalização de verbas orçamentárias destinadas ao pequeno produtor rural. Dessa maneira, o inadiável combate estatal à subnutrição crônica atravessa, mormente, a proteção do agricultor familiar, ameaçada pelo congelamento de gastos proposto na PEC 241.        Face à problemática, convém ao Ministério do Desenvolvimento Social, por meio de prévio diagnóstico socioeconômico, a expansão de programas de assistência a famílias em situação de insegurança nutricional, exemplifique-se o Bolsa Família. Ademais, cabe ao Ministério de Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento, em parceria com empresas públicas e privadas, potencializar a disponibilização de assessores técnicos ao pequeno produtor rural, além de oferecer microcrédito para a garantia do acesso à terra e aos recursos necessários à produção. Ao mesmo órgão, compete a amortização de impostos sobre os artefatos alimentares originados pelo segmento em questão, de modo a incrementar a procura e o consumo. Além disso, é importante a atuação dos grandes grupos televisivos na promoção de campanhas socioeducativas  que elucidem acerca da importância da agricultura familiar no combate à fome crônica e as ameaças ao microprodutor trazidas pelo congelamento de gastos no âmbito social. Em conjunto, tais medidas têm como fito o cumprimento das recomendações dietéticas mínimas necessárias para a fruição do direito social à alimentação.