Enviada em: 19/08/2019

No episódio "Arkengel", da série Black Mirror, uma mãe aceitou implantar um chip em sua filha, a fim de protegê-la. Todavia, enquanto crescia, o aparelho deixou de ser visto pela menina como protetor e se tornou invasor de sua privacidade. Nesse interim, o uso de aplicativos que auxiliam o controle parental pode ocasionar uma reação contrária ao esperado pelos pais, ou seja, a proteção pode ser considerada invasão de privacidade pela criança.    No atual mundo globalizado, é comum o uso de aplicativos para intermediar as relações pessoais, o que pode acarretar no esfacelamento das relações. De acordo com o sociólogo Zygmunt Bauman, a atual modernidade líquida promove relações também líquidas, ou seja, são constantemente mutáveis, o que causa incertezas e desconfianças nas relações pessoais. Assim, a falta de confiança parental sobre as decisões independentes dos filhos e o uso excedente de tecnologias para controlá-los geram um excesso de proteção sobre esses, o que pode arruinar a relação entre pais e filhos.    Esse rígido controle parental por intermédio de recursos tecnológicos pode ter se iniciado por alguma situação indesejável pelos pais. Com a intenção de proteger os filhos, aplicativos de geolocalização e de gravação de telas de dispositivos, são comumente utilizados para impedir que situações desse tipo ocorram novamente. Entretanto, até as ações protetivas devem ser limitadas, para não arruinarem as relações familiares, como ocorrido no episódio citado acima, em que, no final, a adolescente mata a mãe por conta da excessiva invasão de privacidade.     Contudo, é certo que limites são necessários para impedir crianças de assistirem a conteúdos impróprios para suas idades, por exemplo. Nesse contexto, uma pesquisa feita pela Intelbras afirma que uma em cada cinco crianças brasileiras já acessou na internet algum material indesejado pelos pais. Do mesmo modo, deve haver limites para o controle dos pais, a fim de possibilitar que a criança saiba sobre o mundo real e, dessa forma, construa seu próprio caráter.     Urge, portanto, que os pais devem ser menos invasivos nas decisões de seus filhos, visto que, essa não é a melhor forma de proteção. É necessário, então, manter entre eles uma relação ''não-líquida'', em que conversem como pais e filhos sobre seus problemas cotidianos. Mas para que isso ocorra, é importante limitar o uso da tecnologia no controle parental, de modo a aproximá-los e impedir que a intenção inicial -proteção- seja considerada invasão de privacidade.