No mangá Vagabond, história em quadrinhos japonesa criada e serializada por Takehiko Inoue, o antagonista Kojiro Sasaki, ainda na infância, aprende lentamente as artes da espada. Seu mestre tem muitas dificuldades em se comunicar com Kojiro, que se mostra calado e disperso. O que o professor descobre anos depois é que na verdade seu pupilo era surdo. Fora das revistinhas, os desafios na aprendizagem dos surdos é uma realidade no Brasil. Nesse contexto, faz-se necessário entender suas causas, quer culturais, quer pragmáticas, para a resolução do impasse. A princípio, nota-se claramente as faces culturais da temática. De acordo com Einstein, famoso cientista alemão, é mais fácil desintegrar um átomo do que um preconceito enraizado. Nesse contexto, é possível observar que a filosofia de darwinismo social, presente em nosso país desde os tempos da colonização, segrega tacitamente os portadores de deficiência a um espectro de cidadão de segunda classe. Isso gera um sistema ineficiente em lidar com as diferenças, que cria um ciclo vicioso, diminuindo a auto-estima dos surdos e aumentando a evasão escolar. Bom exemplo disso são as taxas de matrículas de deficientes auditivos na Educação Básica, que vêm mostrando uma acentuada e constante queda. Outrossim, é importante destacar a aplicação da legislação vigente. Inegavelmente, houve diversos avanços na seara legal nas últimas décadas,porém a materialização disso tem se mostrado insuficiente. De fato, menos de 2% da população tem contato com a Língua Brasileira de Sinais, mesmo essa sendo considerada a segunda língua nacional. Isso cria um perverso quadro de desigualdade, relegando o Brasil a uma vergonhosa posição de não-inclusão social. Logo, fica evidente a urgência de adoção de medidas concretas e não tão somente conjecturais, pois, segundo a lógica do construtivismo de Piaget, pensar é agir sobre o objeto e transformá-lo. Nesse viés, é imprescindível que o Ministério da Educação, em parceria com as Secretarias da Educação estaduais e municipais, institua palestras para jovens e adultos nas escolas, centros comunitários e eventos, tanto em português falado quanto em Libras, sobre a importância da inclusão dos surdos no processo educativo. Além disso, é essencial que os governos estaduais e municipais criem ouvidorias on-line especializadas para deficientes auditivos, até mesmo por aplicativos de smartphones como Whatsapp e Telegram, recebendo sugestões, críticas e denúncias de forma facilitada dessa sofrida parcela da população. Com a tomada de tais medidas, espera-se que histórias como as de Inoue permaneçam exclusivamente no universo de onde nunca deveriam ter saído: no da ficção.