Enviada em: 11/09/2017

Estar em situação de rua - ou "morar na rua", um termo já obsoleto - é uma realidade pertinente ao longo da História que afeta diferentes parcelas das sociedades desde que existe urbanização. Na Bíblia, diversas passagens mencionam "mendigos leprosos" nas ruas de Roma, e em A República, de Platão, são citados "pedintes" nas portas da Academia de Atenas. Hoje, o Brasil possui cerca de 101 mil pessoas nessa situação, segundo dados do Instituto de Pesquisa Aplicada (Ipea), o que se deve sobretudo a exclusão social, além de conflitos domésticos, e "abandono" assistencial por parte do Estado e da sociedade.        Segundo o Ipea, cerca de 47% das pessoas sem moradia entraram nessa situação por exclusão social. Seja por êxodo rural ou por migrarem de uma cidade pequena para uma maior em busca de melhores condições de vida, e não tendo qualificação profissional, foram excluídas da lógica capitalista graças a uma urbanização tardia do Brasil. Outrossim, uma parcela significativa vai para as ruas por conflitos domésticos, como desavenças familiares, alcoolismo e desemprego - com consequente perda da propriedade de sua moradia, normalmente, alugada.       Uma vez excluídos, permanecem abandonados assistencialmente pelo Estado e se tornam invisíveis para a sociedade civil, sendo tratados como indigentes a serem ignorados e evitados. Por conseguinte, em busca de sobrevivência, muitos aderem à mendicância ou adentram na criminalidade e no uso de drogas,  principalmente o crack, que é entendido pelo senso comum como uma causa e não consequência desse processo. Essa realidade ainda se parece muito com a retratada por Jorge Amado, há oitenta anos, em sua obra Capitães de Areia - que romantiza e critica o tema, especialmente acerca do menor abandonado -, o que revela a persistência dessa questao ao longo do tempo, com raras mudanças para melhor.       Para findar esse problema, que passa pelo âmbito social e também da saúde, é necessário uma maior assistência por parte do Estado para que a dignidade desses indivíduos seja recuperada e sua vida em sociedade se torne possível. Para isso, o Ministério das Cidades deve criar planos de criação de mais "casas de apoio" - que forneçam apoio de moradia, alimentação, educação e saúde - a serem seguidos pelas prefeituras municipais, cabendo ao Ministério Público a fiscalização do empreendimento. Ademais, parcerias entre instituições filantrópicas ou religiosas e prefeituras devem ser fortalecidas, para o fornecimento, também, de auxílio humanitário, psicológico, como já acontece em algumas cidades. Somente assim essa "situação" de rua se tornará pragmaticamente passageira, promovendo a reinserção dessas pessoas na sociedade, com dignidade e cidadania.