Enviada em: 06/08/2018

Na mitologia grega, Procusto era um salteador que possuía uma cama de ferro e a oferecia aos viajantes como repouso. Aos que deitassem nela e a excedesse, Procusto cortava-lhes os pés e aos que deixassem sobrar, eram esticados por cordas. Análogo ao mito, a sociedade brasileira vem causando mutilações irremediáveis na vida de suas crianças ao permitir que essas sejam submetidas à laços matrimoniais. Logo, o casamento infantil no século XXI não se trata apenas de uma negligência  governamental, mas também da naturalidade que o fato é tratado dentro do contexto populacional.    Nesse sentido, é elementar que se leve em consideração que de acordo com o pensamento filosófico de São Tomás de Aquino, em uma sociedade democrática todos possuem a mesma importância e direitos. No entanto, o Estado diverge de tal perspectiva ao permitir que o país possua índices alarmantes de casamento infantil - estando em quarto lugar no ranking global segundo o Banco Mundial. Dessa forma, tais aspectos explicitam a negligência estatal que marginaliza essa parcela populacional, expondo-os a cenários que denigram sua dignidade humana e os afasta gradualmente de seus direitos como cidadãos brasileiros.    Soma-se a isso também que na visão sociológica de Hans Jonas, os indivíduos sociais deveriam agir e tomar decisões de forma que resguardassem a dignidade das próximas gerações. Contudo, tal conceito encontra-se deturpado no cenário nacional, dado que ainda há a visão cristalizada de naturalização diante da formação do matrimônio infantil, mesmo havendo pesquisas como a da Unicef que apresenta que mais de 60% das meninas que se casam antes dos 18 anos, não efetuam o ensino secundário. Dessa maneira, essas meninas, que são as maiores vítimas dessa realidade, ficam diante do despreparo educacional  que não as qualificam para o mercado de trabalho, restando-lhes apenas a paisagem de depreciação da sua figura humana e social.    Diante de tal problemática cabe à três agentes a solução efetiva: O Estado, o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) e ao Ministério de Educação (MEC). Ao primeiro agente importa realizar, em ação conjunta ao segundo, a elaboração de um projeto de assistência social que promova suporte e incentivo econômico para as meninas que tenham baixa renda e suas famílias, em formato de bolsa, para que essas possam permanecer integralmente no ensino escolar. Além disso, o MEC deve organizar projetos que envolvam atividades lúdicas, palestras e apresentações artísticas - uma vez que ações culturais possuem grande poder transformador - a respeito do casamento infantil, que serão aplicados nas comunidades por meio do ambiente educacional. Desse modo, será possível que os pequenos viajantes brasileiros deixem de ser mais uma vítima de Procusto.