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Enviada em: 11/08/2019

A internação involuntária de dependentes químicos é um tema recorrente no país. A ONU preconiza o tratamento voluntário, inclusive com o consentimento por escrito do paciente. Porém, de acordo com a nova lei brasileira sancionada em 2019, a internação forçada poderá ocorrer mediante pedido de familiares ou, na falta desses, de algum representante da área da saúde. Além disso, a referida lei baseia-se na premissa de que o Brasil vive uma epidemia de drogas, entretanto, pesquisas recentes da Fiocruz mostraram que isso não procede, indicando apenas que há um grande consumo de drogas que deveria alertar os gestores públicos. Assim, para o combate ao uso de substâncias químicas, adotou-se uma abordagem punitiva e proibicionista, que promove a privação da liberdade, - ao invés de medidas que priorizem a "redução de danos" - simbolizando um retrocesso nessa luta.        Em primeiro lugar, a internação involuntária de usuários químicos já é utilizada apenas em casos muito específicos, como por exemplo quando há risco de vida do próprio indivíduo ou de terceiros. Outrossim, o tratamento não deveria ser generalizado por meio de uma lei, mas sim particularizado para cada usuário, afinal cada caso é único. Em segundo lugar, a nova lei estimula a "indústria da internação", que é insustentável no atual sistema público de saúde, já que esse setor não é nem capaz de absorver a demanda de internações voluntárias. Nesse cenário, ainda há a carência de alas psiquiátricas preparadas para atender esses pacientes na maioria dos hospital brasileiros.       Sob a perspectiva filosófica de Isaiah Berlin,"o sentido fundamental da liberdade é a liberdade dos grilhões", ou seja, é preciso estar livre de obstáculos externos para que a autodeterminação e as intenções sejam alcançadas. Dessa forma, a internação involuntária e a consequente abstinência induzida privam o indivíduo de ser plenamente livre e dificultam a realização do objetivo final que é o fim do vício do uso de drogas. Somado a isso, a abordagem da abstinência como solução não está ancorada em investigações científicas e abre espaço para violações de direitos, como práticas de tortura e técnicas cruéis.       Portanto é necessário que o governo, em parceria com o Sisnad, adote políticas de "redução de danos", a fim de minimizar os efeitos adversos das drogas e de promover um tratamento humanitário que não cause o cerceamento da liberdade individual. Isso pode ser feito através de um projeto nacional que ofereça aos usuários moradias adequadas, empregos dignos e tratamentos terapêuticos consentidos, além da divulgação de campanhas que combatam o uso de drogas e que mostrem que há métodos de reabilitação estatais voluntários e benéficos. Assim, os dependentes químicos poderão ser tratados pelo Estado e serão incluídos nos ambientes coletivos.