Materiais:
Enviada em: 01/06/2018

O aborto no Brasil deve ser tratado como caso de saúde pública e não tipificado no código penal como crime passível de punição. Todos os anos, milhares de mulheres morrem em virtude de interrupções de gestação mal sucedidas, seja em clínicas clandestinas seja por meio da ingestão de determinados medicamentos. Dentre os argumentos utilizados para a manutenção da política punitiva em relação ao aborto, destacam-se a concepção sagrada de vida, vinculada à base histórica religiosa, assim como a recente organização patriarcal do país.    Embora o país seja considerado laico desde 1890, a partir de um decreto de Ruy Barbosa, percebem-se, ainda hoje, os impactos do tratamento de aspectos que vão de encontro aos valores católico-cristãos que “orientam”, de forma geral, a nação – a com maior números de católicos no mundo segundo o IBGE). Não há uma divisão clara entre religião e Estado, situação evidenciada na pauta de muitos representantes do povo, o que há é a tentativa de garantir eleitores ou de se afirmar um posicionamento incoerente com a função política e com as necessidades reais da população.    Além disso, os resquícios do patriarcado influenciam em decisões que dizem respeito, maiormente, às mulheres. Esse sistema social deixou como herança o estereótipo da mulher/mãe, que, nessa condição, não deve relegar a função que lhe cabe enquanto progenitora, sendo mais aceitável, então, o fechar os olhos para o perfil de mulheres que recorrem ao aborto, enquadrando-as como criminosas e não como mulheres, jovens, mães, trabalhadoras, estudantes.    Em vista do exposto, portanto, entende-se que a questão mereça um tratamento diverso do atual, já que pesquisas (PNA 2016) preveem mais abortos, mais mortes, mais problemas. Descriminalizar e posteriormente legalizar o procedimento de interrupção da gravidez é um caminho necessário para propiciar reflexões acerca da base histórica que sustenta esse posicionamento. Só assim, a nação poderá superar um dos entraves para a constituição efetiva do Estado laico bem como o reconhecimento de ação e decisão da mulher sobre o seu próprio corpo.