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Enviada em: 22/10/2018

A obra literária “O cortiço”, de Aluísio de Azevedo, retrata as péssimas condições de saneamento básico vivenciadas pelos habitantes das zonas periféricas no cenário urbano brasileiro do século XIX. No entanto, mais de um século após a publicação da obra, verifica-se que grande parte da população, em especial de regiões empobrecidas, ainda carece de serviços básicos como água potável, coleta e tratamento de resíduos. Nesse sentido, é imprescindível a correção das mazelas sociais que projetaram esse cenário de exclusão, bem como o fortalecimento de políticas públicas para o provimento desses serviços à população.         Primeiramente, é necessário compreender que desde o período colonial determinados grupos sociais são privados do acesso a condições dignas de vida. Nesse contexto, o sociólogo Gilberto Freyre destaca que a infraestrutura na casa dos senhores de escravos era muito distinta das instalações da senzala. Essa não dispunha de espaços adequados para a higiene, tampouco ofertava água fresca às pessoas escravizadas. De maneira análoga, o modelo de exclusão social desse período ainda persiste na mentalidade de algumas autoridades públicas, haja vista o imenso contingente populacional que vive exposto a condições degradantes, como a onipresença do esgoto a céu aberto, característica marcante de comunidades negligenciadas pelo Estado.        Destarte, o posicionamento do setor público diante da falta de provimento desses direitos sociais permanece insipiente. Nesse sentido, a política nacional para a universalização do saneamento básico não atingiu a capilaridade necessária em todos os municípios brasileiros. Com isso, o cenário descrito por Aluísio de Azevedo persiste não somente no imaginário literário, mas também no cotidiano de milhões de cidadãos brasileiros. Nessa perspectiva, tais condições acarretam exposição a enfermidades típicas de ambientes poluídos, bem como prejuízos psíquicos, uma vez que a negativa dos direitos previstos nas cláusulas pétreas impede o reconhecimento da cidadania a esses sujeitos.       Depreende-se dos fatores fundantes e mantenedores da caótica situação do saneamento básico no Brasil, que medidas corretivas são fundamentais. Assim, cabe à União a reserva orçamentária para custeio e manutenção de instalações sanitárias e estações de tratamento de água em todos os municípios brasileiros. Com efeito, espera-se que as populações mais pobres possam, finalmente, ter acesso universal ao saneamento básico e, dessa forma, minimizar os agravos à saúde derivados da exposição a ambientes degradados, assim como ter sua condição de cidadão reconhecida, na prática, pelo Estado. Somente assim os retratos da desigualdade mostrados por Aluísio de Azevedo poderão permanecer, de fato, no passado do Brasil.