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Enviada em: 25/06/2019

Segundo a filósofa alemã Hannah Arendt, a irreflexão individual decorrente da violação da liberdade de pensamento promove a banalização do mal. Assim, os indivíduos tornam-se meros autômatos obedientes aos ideais deturpados já consolidados na sociedade. Cotejando o pensamento da egrégia estudiosa e o cenário brasileiro contemporâneo, evidencia-se a perpetuação da violência contra a mulher como corolário imediato de tal configuração social, essencialmente amparada pelos ideais machistas difundidos desde o Período Colonial. Nesse contexto, faz-se mister analisar a objetificação da mulher promovida pela mídia e a ociosidade governamental como sustentáculos dessa conjuntura.   Sob a ótica de Immanuel Kant, a ação puramente movida pelo senso de dever moral é condição indispensável para a dignidade nas relações inter-humanas. Tal ação baseia-se na consideração dos indivíduos sempre como um fim em si mesmos, e não como um meio para o benefício próprio. Hodiernamente, a violação da ética kantiana é um agente propulsor da violência contra a mulher, ao passo que a imagem midiática da mulher como mero instrumento de satisfação dos prazeres masculinos está fundamentalmente atrelada aos princípios de que esta deve ser castigada quando não obedecer à autoridade masculina. Consequentemente, atos de violência contra a mulher são banalizados mediante a consolidada consideração de sua inferioridade social.   Outrossim, é indubitável que aspectos governamentais estão intrinsecamente relacionados à problemática. Para o contratualista John Locke, o designo primordial do Estado é preservar os direitos naturais dos cidadãos, assegurando sua segurança. Não obstante, mediante os últimos dados do Mapa da Violência 2012, o quantitativo de feminicídios sofreu um aumento de 230% nas últimas três décadas. Esses dados evidenciam que a ação legal se distancia da efetivação, haja vista que apesar de existirem leis que visem a combater a violência contra a mulher, como a Lei Maria da Penha, o Estado indispõe do aparato infraestrutural para punir os culpados e fornecer amparo psicológico às vítimas.   Em vista dos fatos supracitados, urge a necessidade de ações efetivas a fim de conter o avanço da violência contra a mulher, posto que a objetificação da mulher e a falta de efetivação legal garantem a resistência do mal enraizado em nossa sociedade. Assim, concerne à mídia nacional promover a valorização das mulheres em propagandas e programas televisivos, enfatizando o respeito devido a elas. Ademais, compete ao Estado, por meio da disposição de atendimento psicológico às vítimas nas delegacias, a construção de um meio mais propício às denúncias visando a garantia da saúde emocional feminina. Somente assim, tornar-se-á possível estourar a bolha da passividade que perpetua a cegueira moral responsável pelo mal moderno descrito por Arendt.