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Enviada em: 15/07/2017

Patriarca social       "O Peru de Natal". Assim Mario de Andrade, autor do modernismo brasileiro, intitula um de seus contos, cuja história se organiza ao redor de uma família que passaria a primeira festividade longe do falecido e rígido patriarca. Da mesma forma que o jovem da narrativa luta para atenuar a pesada memória do pai, a pós-modernidade trava batalhas intensas contra os fatores preocupantes das multifacetadas relações familiares. Simplificadas em uma dicotomia, as noções acerca desse grupo ora revelam sua importância em sociedade, ora demonstram a urgência de revisão de conceitos problemáticos intrínsecos.        Para que a questão seja compreendida, faz-se crucial que a função mais básica desses núcleos sociais seja colocada em discussão. A família é elemento que mantém relações diretas com a cultura, uma vez que funciona como primeira coletividade e cria ambiente de socialização inicial. Dessa forma, como qualquer elemento que envolve vários indivíduos, seus conceitos não são estáticos e variam com a alteração do espaço geográfico e com a passagem do tempo. Transmissora de valores e noções essenciais à convivência, a família age como preparadora e promove espécie de "ensaio" para interações futuras, exteriores e mais complexas. A emergência de novas estruturas familiares, dessa maneira, apenas ratifica a necessidade de posições esquecidas hoje: compreensão e respeito.       Hannah Arendt, estudiosa do século XX, aponta a relação entre educação familiar e política: após a queda de regimes totalitários na Europa, os indivíduos perderam noções de autoridade, fator que refletiu nas crianças. Contemporaneamente, é possível identificar diversas problemáticas que criam os chamados "déspotas mirins" - resultados da inversão literal dos valores da clássica hierarquia familiar -, figurando a falta de limites e a inserção precipitada de crianças no mundo adulto. Outra questão advém da característica superficialidade atual, que, somada à individualidade, renega a propriedade fundamental da família.        Assim sendo, fica claro o impasse que cerca tais grupos sociais. Torna-se, pois, fundamental que a escola atue no ensino das diversidades culturais e familiares, por meio de trabalhos, debates e palestras interessantes. ONGs podem promover campanhas inteligentes, que estimulem o senso crítico e a negação de preconceitos, em parceria com a mídia. A problemática que acompanha os núcleos familiares é complexa e sua resolução, lenta. Engajamento coletivo e comprometimento, contudo, podem ser os primeiros passos para que a luta contra o "patriarca" de sólidos obstáculos sociais, representados por Andrade, seja, enfim, vencido.