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Enviada em: 17/02/2019

O processo de adoção no Brasil apresenta dificuldades bem conhecidas. De fato, parece não haver acordo entre os interesses dos pais que desejam adotar, e a realidade dos abrigos brasileiros. Sobre isso, os conflitos mais lembrados são: (1) a maioria dos adotantes não deseja acolher irmãos, como também (2) prefere crianças de menor idade. Diante do exposto, nosso intento é defender que em virtude do primeiro problema ser aparente, o segundo se revela real.        Para julgar com justiça a procedência ou não do primeiro ponto, precisamos analisar os números com bastante cuidado. Decerto, o Cadastro Nacional de Adoção aponta que dois terços dos brasileiros só estão dispostos a adotar filhos sem irmãos. Por outro lado, na mesma fonte encontramos dados sobre o perfil dos menores: apenas um terço desses correspondem à expectativa dos que desejam garantir um lar aos que sofreram alienação parental. A situação inspira preocupação.        Diante de frações tão dissonantes, uma boa dose de prudência se faz necessária. Isso se justifica porque nem mesmo o Correio Braziliense, em notícia veiculada em 04 de Março de 2018, escapou de incorrer em uma conclusão apressada – ao sustentar que a diferença de proporções entre as partes representa um “descompasso histórico entre o perfil desejado de futuros pais diante dos futuros filhos adotivos”. Ora, o equívoco do dileto jornal decorreu em virtude de atentar apenas à porcentagem relativa dos grupos e ignorar completamente a influência dos números absolutos na questão. Por isso, é preciso levar em conta que a porção de pais dispostos a adotar ultrapassa a quantidade de crianças cadastradas doze vezes! Ou seja, a despeito do “descompasso relativo”, para cara 200 menores com irmãos (2/3 de 300), temos na fila de espera 1200 pais (1/3 de 3600) que de modo algum consideram adoção conjunta de irmãos um empecilho.        Finalmente, a sociedade deve questionar e verificar se o problema não reside no excesso de rigor do Estatuto da Criança e do Adolescente nessa questão específica. Se, por um lado, separar irmãos foge da solução mais ideal possível, cremos que é urgente agilizar o processo de adoção mesmo nessas condições para evitar um mal maior: impedir que tais crianças continuem no abrigo em idade avançada, pois esse realmente parece ser o maior impasse ao processo de adoção no Brasil.