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Enviada em: 31/08/2018

Conforme o historiador francês Philippe Ariès, a ideia de infância é uma construção social originada no século XX. Até então, as crianças eram categorizadas como adultos em miniatura e, nessa condição, expostas ao trabalho e à sexualidade desde muito cedo. Nesse sentido, a persistência do casamento infantil no século XXI demonstra a coexistência da legislação legal, a qual visa à proteção e direitos das crianças, com o entendimento arcaico, por uma parcela da sociedade, segundo o qual a criança apresenta estrutura física e psíquica similar ao do adulto. Com isso, medidas corretivas são necessárias para assegurar os direitos sociais constitucionais dos infantes.         Em primeiro lugar, destaca-se que a ocorrência do matrimônio infantil ocorre, de maneira geral, em regiões mais afastadas da atuação do Estado no controle e fiscalização dos direitos da criança. Tem-se, com isso, um ambiente fecundo para transgressões das normas constitucionais que protegem a infância, sedimentadas na noção cultural de que a criança estaria apta para se comportar de modo análogo ao adulto. Não obstante, o critério cultural não exclui os sujeitos das penalidades previstas em lei, tipificada no crime de pedofilia. Sob tal ótica, a repressão do casamento infantil deve ser coordenada pelas forças de segurança de maneira concomitante à mudança de perspectiva dos infratores sobre o papel social da criança.        Conforme o filósofo Platão, “viver não é importante, mas viver bem”. Sob tal ótica, a garantia da infância enquanto um período vital de desenvolvimento psicológico, cognitivo e social do infante é fator fundamental para a edificação de cidadãos mais instruídos sobre a sua função na garantia do bem-estar comum. Nota-se, com isso, que as crianças expostas ao casamento infantil são destituídas dos direitos sociais básicos necessários ao desenvolvimento da cidadania na idade adulta, fato este que colabora para a manutenção e reafirmação de práticas criminosas como o matrimônio infantil.        Faz-se necessário, portanto, que Estado brasileiro reserve mais recursos do orçamento da União para o aparelhamento dos conselhos tutelares, em todos os municípios brasileiros, com a finalidade de intensificar a atuação e controle sobre a prática do casamento infantil, sobretudo nos pontos mais isolados do território nacional, bem como a adequada punição e posterior recuperação social dos adultos infratores. De modo complementar, é de responsabilidade municipal a oferta de serviços de saúde, educação e assistência social a crianças e famílias em vulnerabilidade social derivada da exploração sexual infantil. Com isso, será possível mitigar os efeitos nefastos, denunciados por Philippe Ariès, que as representações sociais antiquadas da infância impõem à sociedade no século XXI.