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Enviada em: 17/07/2017

Literaturas ficcionais       As favelas seriam comparáveis a "quartos de despejo", segundo Carolina Maria de Jesus. Catadora de papeis, mãe e negra, a escritora brasileira retratou as mazelas e dificuldades da pobreza no espaço em que vivia. Ferreira Gullar, por sua vez, é autor do poema "O açúcar", no qual comparou o produto doce, branco e puro com a vida amarga, dura e escura dos trabalhadores que o produzem nas usinas. Fora da literatura, a realidade brasileira não muda e a desigualdade insiste em se firmar: fruto de noções enraizadas, a pobreza implica problemáticas sociais graves e que há muito não podem ser ignoradas.        Para compreender a questão e os impasses que a cercam, é necessário recorrer ao passado histórico-social que a produziu. É possível inferir que a concentração de poderes e privilégios nas mãos de uma minoria numérica encontrou apoio na opressão e segregação, elementos que foram capazes de excluir um grande grupo e transformá-lo em minoria social. A rápida e desordenada urbanização brasileira foi acompanhada de processos como a gentrificação, a periferização e a favelização, que contribuíram para tornar físicas as desigualdades observadas contemporaneamente. Carlos Drummond de Andrade, em seu poema "Favelário Nacional", definiu o problema com maestria ao afirmar que "somos desiguais e queremos ser sempre desiguais".        As palavras de Drummond são apenas metonímias de uma contradição que parece se avolumar: um abismo separa a população abastada daquela que convive com a pobreza, status quo que provoca consequências merecedoras de atenção. A desumanização de indivíduos às margens da sociedade mantém relações diretas com a privação de acesso a direitos básicos e essenciais. Dessa forma, as segregações sociais funcionam como obstáculos de difícil transposição e afetam de maneira profunda os grupos que as vivenciam.       Assim sendo, é indubitável o afastamento quase que voluntário do Brasil diante de questões como a pobreza. Conforme linguagem machadiana, contudo, não se pode fechar os olhos a tais sardas e espinhas sociais. Nesse sentido, ONGs podem atuar, em parceria com a mídia, na divulgação de campanhas engajadas, que integrem as comunidades na luta contra desigualdades de qualquer gênero. O poder público deve intensificar a promoção de políticas afirmativas e socioeconômicas, tão necessárias em cenários como o atual. O caminho a ser trilhado nesse embate é longo e difícil de ser percorrido, mas sólidas concepções de responsabilidade social e comprometimento podem transformar literaturas de denúncia, em ficções em nosso tempo.