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Enviada em: 05/09/2018

Deixa disso, camarada   "Dê-me um cigarro, diz a gramática, (...) mas o bom negro e o bom branco da nação brasileira dizem todos os dias: deixa disso, camarada. Me dá um cigarro." Esse trecho, do poema Pronominais, escrito por Oswald de Andrade evidencia-se o caráter volátil da língua, a qual apresenta inúmeras variações. Contudo, apesar da tolerância às diferenças ser um dos preceitos da Constituição Federal Brasileira, o preconceito linguístico é realidade no país. Nesse sentido, a impunidade Estatal e a corrupção de valores sociais - fruto de falhas educacionais - contribuem para a manutenção dessa atitude inconstitucional.   A priori, à luz do historiador Sérgio Buarque de Hollanda, as raízes da formação do pensamento brasileiro são denotadas por uma cordialidade. E, esse fato, permite que preconceitos como a intolerância à variações linguísticas sejam tratados de forma velada. Ou seja, o corpo social encara essa discriminação como algo natural, haja vista a falta de denúncias dos casos e a constante recorrência de piadas que criticam as variantes regionais e sociais da língua. Além disso, parafraseando o pedagogo Paulo Freire, a educação brasileira é bancária. Isso significa que o conhecimento é apenas depositado no aluno, consequentemente esse não é estimulado a críticas e reflexões ao mundo que o cerca e torna-se um indivíduo com visões generalizadas, a exemplo: a interpretação da norma culta como única forma certa de comunicar-se e as outras formas de expressão como erradas, marginalizando-as.   Em segunda análise, o Poder Executivo falha em não estimular a conscientização e a punição dos transgressores, uma vez que não existe ouvidorias nesse sentido, logo, perpetua-se a ideia do preconceito linguístico não ser um problema prioritário, porém essa rejeição a determinados falantes é um dos meios que mais favorecem a criação de esteriótipos de diferenciação social e por conseguinte, aumenta-se a exclusão social. Tal fato, é consoante ao pensamento do linguísta brasileiro Marcos Bagno, em que defende a ideia da valorização das diferentes variações da língua - gírias, pronúncias, expressões - como forma de inclusão da população, principalmente das classes com menor poder aquisitivo, pois todos compartilham o mesmo idioma e cumprem com sucesso a missão da linguagem: comunicar.   Diante dos fatos supracitados, faz-se necessário que o Poder Executivo - sobretudo na voz das prefeituras - deve criar ouvidorias para estimular a denúncia de casos discriminatórios da fala. Além disso, o Ministério da Educação deve prover a conscientização da tolerância à variações linguísticas nas escolas, por meio de palestras ministradas por especialistas na área, com o intuito de fornecer base para a desconstrução de discursos preconceituosos. Dessa forma, a nação brasileira será mais tolerante e menos presa a regras gramaticais da fala, assim como é retratada no poema de Oswald de Andrade.