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Enviada em: 24/09/2017

Somos todos poliglotas?      "Minha pátria é minha língua", tal afirmação é encontrada em "O livro do desassossego", de Bernardo Soares - heterônimo de Fernando Pessoa. É perceptível como essa frase representa a forma pela qual esse mecanismo de comunicação traz algo inerente a ele, o sentimento nacionalista de pertencimento. Entretanto, algo paradoxal permeia o âmbito da comunicação: o mesmo código que tem por objetivo possibilitar a interatividade entre emissário e receptor é aquele que causa a exclusão dos falantes que não a utilizam segundo a configuração da norma culta.    Indubitavelmente, a língua é uma entidade viva e dinâmica. Outrossim, não se trata de um instrumento que permanece inerte e indiferente às mudanças vivenciadas pelos falantes, mas ela representa e se harmoniza com a cultura de um povo, bem como as vivências de um indivíduo. Dessa forma, é perceptível a variabilidade linguística existente dentro do Brasil, na qual, parecem haver várias línguas dentro da língua portuguesa, visto que em cada canto podem ser observadas particularidades oriundas daqueles que se comunicam.      Contudo, não é algo incomum ver que alguns indivíduos se consideram superiores a outros, porque falam de forma "diferente". Tal idiossincrasia se configura absurda e representa a causa da exclusão de diversos falantes. Segundo um levantamento realizado pela Unesco, o Brasil é o oitavo país com mais analfabetos no mundo. Assim, tendo em vista os fatos elencados, é inescrutável que essa população de analfabetos engloba também a população de excluídos dentro da sociedade hodierna. Dessa forma, é tácito que a língua consiste não somente em um instrumento de comunicação, mas também pode ser vista como um mecanismo de poder e dominação de um indivíduo sobre outro.     Logo, pode-se concluir que o caminho não é desvalorizar a gramática, visto que ela possibilita a unidade linguística, mas deve-se ter sensibilidade para entender as variantes que advém do uso da língua. Faz-se necessário ter a percepção de que esse tema deve ser discutido amplamente nas escolas, possibilitando a formação de cidadãos desprendidos da ideia preconcebida de que o diferente é errado e deve ser suprimido. Além disso, o Governo Federal deve adotar medidas mitigadoras que visem diminuir a taxa de analfabetismo no Brasil, possibilitando ao cidadão aprender a linguagem padrão e, atrelado a isso, reconhecer que dentro desse universo vasto da linguagem não se deve desconsiderar as variantes inerentes a ela. De tal maneira, ao compreender esse "poliglotismo" interno - que cria a existência de diversas minúcias dentro de uma única língua - e as implicações relacionadas a ele, a língua cumprirá seu papel: comunicar e incluir.