Materiais:
Enviada em: 11/08/2018

"Os preconceitos tem raízes mais profundas que os princípios". Tal máxima, cunhada por Nicolau Maquiavel no obscuro período do absolutismo europeu, se ratifica no contexto hodierno tangente à doação de sangue no Brasil e à discriminação enfrentada por homossexuais, os quais são descartados do processo em virtude de uma norma vetusta e equivocada, cujos princípios se fundamentam em conceitos preconcebidos acerca da origem do vírus da imunodeficiência humana (VIH ou HIV). Tais errôneas ideias relacionavam a AIDS – síndrome potencialmente fatal provocada por esse vírus – aos homens homoafetivos, criando um estigma ainda não superado pelo sistema de saúde brasileiro, o qual fere seus preceitos ao impedir doações que poderiam salvar vidas.       Consoante aos fatos expostos, é incontrovertível, pois, que o descarte do sangue de um doador assumidamente homossexual seja um reforço às profundas raízes do preconceito na sociedade canarinha, afinal, esse imbróglio se fundamenta na discriminação da sexualidade do ser humano, quando, na realidade, o fator determinante é o seu comportamento sexual desprotegido. Nesse sentido, de modo análogo ao conceito de "desterritorialização" criado pelos filósofos Deleuze e Guattari, tal cidadão é desterritorializado socialmente na medida em que é alijado de um processo teoricamente isonômico, ainda que seu comportamento não possa ser considerado de risco.       Destarte, o Ministério da Saúde descumpre com seu dever constitucional ao desprezar indivíduos potencialmente saudáveis por um fator impreciso como a autodeclaração da homossexualidade e se exime da responsabilidade sobre a necessidade de oferecer testes mais avançados para a urgente realização de transfusões sanguíneas. Ou seja, nesse ínterim, a saúde da nação do século XXI tem seus fundamentos subordinados ao rótulo dos anos 80 que associava o HIV ao homossexual masculino, embora outras categorias, como de mulheres heterossexuais, tenham se tornado propensas à contaminação pelo vírus, de acordo com dados da OMS (Organização Mundial da Saúde).       Em vista dos fatos elencados e da dificuldade hercúlea na dissolução de preconceitos socialmente arraigados, urge que medidas pragmáticas e basilares sejam tomadas. Com efeito, o Ministério da Saúde deve apartar a norma discriminatória e padronizar a aplicação de testes mais rápidos e precisos, tendo em vista que grande parte dos indivíduos omitem dados referentes às suas práticas sexuais, por se tratar de um tabu social. Ademais, o Ministério da Educação deve elaborar materiais didáticos referentes ao tema, que possam ser trabalhados no ensino fundamental e médio, salientando a importância da doação de sangue e do uso de preservativo no ato sexual. Dessa forma, extinguir-se-á o preconceito maquiavélico enraizado na sociedade, cultivando valores e princípios constitucionais.