Materiais:
Enviada em: 20/10/2018

"Penso que não cegamos, penso que estamos cegos, cegos que veem, cegos que vendo não veem". O excerto da obra modernista "Ensaio sobre a Cegueira" de José Saramago, crítica, por meio do uso de metáforas, a alienação de uma sociedade que se torna invisual. Fora do universo literário, tal obra atemporal não foge da cegueira contemporânea, na qual o tecido social brasileiro não enxerga os preconceitos enfrentados pelos homossexuais na doação de sangue. Nesse aspecto, dois fatores são relevantes: a inobservância governamental e a questão histórica.        Em primeiro plano, vale ressaltar, que a negligência do governo é uma das principais causadoras do impasse. Destarte, o iluminista Rosseau, no contexto da Revolução Francesa, afirma o papel do Estado em garantir igualdade jurídica. Contudo, a prática deturpar a teoria, embora a Constituição Federal de 1988 diga que todos são iguais perante a lei, sem distinção de origem, gênero, raça ou qualquer natureza, para os homossexuais isso não ocorre. Em virtude da incompetência do poder público em proibir a doação de sangue para o grupo LGBT, pelo equívoco preconceituoso de "gay ser sinônimo de HIV", apesar do Dr. Drauzio Varella ter desmitificado esse pensamento arcaico e permitir a inclusão da doação desse líquido vermelho para os gays que não sejam portadores de DST's. Dessa maneira, é inadmissível que às demandas sociais retratadas no século XVIII ainda persistam nos dias atuais.    Outrossim, não obstante, convém frisar que a herança histórico-cultural potencializa atos constitucionais. Isso ocorre pela discriminação e homicídios que os homossexuais sofreram desde a Idade Média, quando o catolicismo considerava aberrações pessoas que tinham relações com o mesmo sexo. Análogo a isso, a sociedade, então, por tender a incorporar as estruturas sociais que são impostas à sua realidade, conforme defendeu o sociólogo Pierre Bourdieu, naturalizou e reproduziu a problemática passível e alheia de soluções. Dessa maneira, a proibição da doação desse líquido para o público homoafetivo precioso tem caráter preconceituoso e não é à toa que apenas um pouco mais de 1% da população seja doadora, segundo o site Aprenda a Valorizar.     Torna-se evidente, portanto, que o preconceito enfrentado pelos homossexuais na doação de sangue representa um antagonismo a ser combatido. Para tanto, cabe ao Ministério da Saúde, em parceria com o Ministério da Justiça, permitirem que os gays doem também esse líquido vermelho, por intermédio de uma criação na lei para os centros de saúde. Nessa ação, os sangues dos voluntários não portadores de DST´s passarão pelo critério da OMS (Organização Mundial de Saúde) para testarem e disponibilizarem para os pacientes, com o fito de quebrar o preconceito e aumentarem os estoques. Desse modo, será possível romper a cegueira ditá por Saramago.