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Enviada em: 14/10/2018

Em "A Hora da Estrela", de Clarice Lispector, a personagem Macabeia representa a personificação da invisibilidade social, visto que os dramas vivenciados pela protagonista permanecem ignorados pela sociedade. Longe do campo literário, a situação dos indivíduos com prostituição no Brasil, principalmente mulheres e menores de idade, assemelha-se à abordada na obra, haja vista que, muitas vezes, têm a cidadania negligenciada pela ineficiência na atenção a direitos básicos. Nesse contexto, é imprescindível refletir sobre as causas dessa problemática e buscar os caminhos para combatê-la.       A princípio, a identidade cultural brasileira foi construída  ao longo do processo histórico de maneira deturpada, a partir da  ênfase na sexualização feminina. Com efeitos, comprova-se isso já na gênese da colonização, em que o erotismo das indígenas era destacado pelo colonizador e, lamentavelmente, utilizado como justificativa para exploração sexual. De maneira análoga, essa construção imagética de objetificação persiste na sociedade hodierna, onde a beleza e a sensualidade da brasileira são utilizadas por redes criminosas de turismo sexual, ancoradas, em boa parte, na prostituição infantil e no tráfico de mulheres, de acordo com os dados da Organização das Nações Unidas. Por conseguinte, a ineficácia estatal no enfrentamento desse problema contribui para a subtração de um dos principais direitos constitucionais: a dignidade humana.       De outra parte, o preconceito representa também um empecilho para atenuação do panorama de indiferença. A esse respeito, o sociólogo Émile Durkheim criou o conceito de "anomia social" para designar as atitudes destoantes das regras morais. Sob essa lógica, a mercantilização do sexo pode ser encaixada nessa teoria, tendo em vista a presença de um forte pensamento machista no Estado brasileiro, que estigmatiza quem utiliza - por opção pessoal-  dessa prática como forma de trabalho, julgando-a de ilegítima e imoral. Destarte, em uma nação democrática, cujo liberdade é um dos pressupostos legais, não é aceitável que pessoas sejam discriminadas pelas suas escolhas.       Urge, portanto, a necessidade de salvaguardar os direitos previstos na Carta Magna. Para isso, cabe ao Poder Legislativo aumentar o percentual de investimento no combate ao turismo sexual, por meio da alteração na Lei de Diretrizes Orçamentárias, na qual possibilite o trabalho de investigação do Ministério Público, bem como o incremento de operações federais com equipe suporte( policiais e setor de inteligência). Almeja-se, com isso, aplicar as devidas sanções legais aos criminosos e encaminhar as vítimas para serviços governamentais de saúde e assistência social. Assim, o alastramento macabeano, responsável por construir vários invisíveis sociais, talvez, deixará de fazer parte da realidade brasileira.