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Enviada em: 08/10/2019

No Brasil, em decorrência da falta de criticidade de muitos cidadãos, tornou-se corriqueira a compreensão de que a crise na mobilidade urbana não afeta drasticamente a dinâmica atual. No entanto, embora essa perspectiva permaneça no senso comum, naturalizando esse modo de pensar, é preciso notar o quanto esse ponto de vista é ingênuo ao possibilitar que o indivíduo se isente da culpa e aponte culpados.     A má qualidade de transportes públicos é uma de suas causas, já que aumenta a busca por veículos próprios. Afeta sistematicamente a vida dos sujeitos. Esses entendimentos sobre o sistema citadino de locomoção, mesmo que simplistas, tendem a ressaltar fatores como a falta de estrutura para meios alternativos de deslocamento, como ciclovias, segundo a Associação de Ciclistas Urbanos de São Paulo. Em geral, quando a sociedade não se predispõe a assumir posturas críticas e sensatas, toda a atualização de valores fica propensa a exaltar padrões de conduta nocivos e desvirtuados que banalizam tal problema. Como se não bastasse, há de se atentar, também, à forma perniciosa como diversos segmentos sociais se comportam diante desse assunto, ao subestimar a disposição de 83% da massa para usar meios coletivos de transporte, mas a falta de suporte para isso, segundo o IBOPE.    Por conta disso, no debate acerca do deslocamento em cidades, é preciso enfatizar a urgência do investimento em um maior senso de corresponsabilidade coletiva. Dessarte, em consonância com as ideias da Teoria da Coesão Social, de Durkheim, e do poeta John Donne, não se deve perguntar por quem dobram os sinos, deve-se notar que dobram por todos. Desse modo, é possível evitar a proliferação de posturas meramente acusatórias que, além de desprezarem a atuação pouco eficaz ou inexistente de agentes públicos, também agenciam o aborto de sonhos e o assassinato de esperanças, ao passo que milhares de pessoas passam diversas horas no trânsito a caminho do trabalho, escola ou faculdade, o que pode diminuir sua produtividade e afetar sua vida. Sob essa égide, mais do que se eximir da culpa para apontar culpados, os brasileiros devem atentar-se ao seu poder de ingerência.    Certamente, quando restrita a fatores inoportunos, qualquer iniciativa contra a crise da mobilidade urbana está fadada ao insucesso. Portanto, faz-se necessário que o Estado, por meio da parceria entre o Ministério das Cidades com governos municipais, garanta transporte público de qualidade, ao melhorar a condição de ônibus e da malha rodoviária citadina, e assegure rodízios dos automóveis, como já ocorre em grandes centros, a fim de diminuir a circulação de veículos privados, o que pode reduzir o tempo perdido com deslocamento. Afinal, parafraseando o filósofo grego Heráclito, a mudança deve ser o princípio fundamental de tudo.